Revolta
(Reiner Kunze)
“Marcuse? Você tem um livro de Marcuse? Vê se me empresta
ele...”
Eu disse a ela que nesse livro Marcuse dá uma visão da
filosofia desde seis séculos antes de Cristo até nossos dias.
“Não faz mal”.
Dois milênios e meio de filosofia, isso não é pouca coisa,
eu disse. Aí, ainda falta perspectiva a uma pessoa com dezesseis anos.
“Mesmo assim. Eu tenho que ler isso”.
Eu dei o livro a ela. Apenas lamentaria, disse eu, quando
ela o deixasse de lado depois da primeira página, para nunca mais por a mão.
“Ah! Claro que não. Se o livro for dele”.
Eu disse a ela que devia saber que há dois Marcuses.
“E daí? Mas esse aqui é o tal que provocou as revoltas
estudantis?!”
Você quer dizer Herbert Marcuse, eu disse. Esse aqui é
Ludwig Marcuse. Nesse livro, trata-se de entender o que torna humanos os
homens.
“Ah! é?” O olhar dela dirigiu-se à lombada do livro. “Então,
não preciso dele, não”.
[ Die Wunderbaren Jahren, ed. Fischer,
1976-2002, p. 51; trad. Bento Itamar Borges]
Olha só! O livro virou filme em 1980, dirigido pelo mesmo Reiner Kunze, que migrou da Alemanha de lá, para a de cá. |