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sábado, 10 de março de 2012

KRISE, KALOTE E ONDA GIGANTE


Então, como dizem os mineiros ao retomar a conversa, já começamos a ler e reler o livro Crítica e teorias da crise, em sala de aula. Lêem os alunos e alunas, uns vinte, e releio eu, o autor do que foi antes tese de doutorado, UFMG, ano 2000. A sala de aula é de pós-graduação: depois da graduação, é hora de ler coisas mais complicadas (e de contar um pouco os segredos do ofício, o making of).

Na primeira aula, o professor quis mostrar a conexão entre sua pesquisa no mestrado e a seguinte, para obter seu Dr. Não escapamos muito do tema inicial, mas podemos mudar um pouco ou muito o enfoque, a direção: em vez de ir com a turma do Prof. Stein em busca de linguagem e fundamentação, encaramos por uns dez anos a crise. Na segunda aula, o professor expôs a Introdução do livro, que tem um título: "A dialética do progresso", esse movimento pastoso entre progresso e crise - tensão que fica bem quando associada à batida figura "dois lados da mesma moeda", já que o dinheiro  sofre na crise e nós com ele ou sem ele. (Ou seja: sobra mês no fim de nosso salário, minha cara comadre e marquesa. E um dos nomes da crise é a carestia, mais enganosa em tempos de real forte.)

Vamos tentar expor os próximos capítulos do referido livro, em forma de seminários a cargo de duplas ou trios de alunos. E seria bom tentarmos uma compreensão interna, sob as categorias da época, sem ilustrar o argumento com exemplos deste capitalista século XXI - para evitar a dispersão, que é o preço pago pela mania de "atualizar a discussão", o que nem sempre é pertinente.  Para isso, a primeira sugestão foi: reúnam, recortem e salvem artigos e arquivos e idéias sobre crise, para um painel a ser apresentado depois da leitura do livro. Há sempre uma overdose de artigos sobre crise, com usos e abusos do termo. Por exemplo, em torno da feira de cinema, Oscar 2012, falam novamente em crise do cinema. Desde sempre, essa "invenção sem futuro", que é a segunda área da indústria norte-americana. Mas agora a Kodak faliu...

Agora e aqui uma segunda proposta, que não exclui a primeira: trarei meus próprios textos e notas para este blog em fase de reanimação, com café forte, mas sem desfibrilador. Aos poucos, quero ver aqui, no novo papel social de "seguidores", todos os alunos da disciplina de quinta-feira. Sim, claro, vai rolar uma leve chantagem, como já aconteceu na graduação: podemos avaliar positivamente essa participação. Fazer o quê? Pontinhos aqui e ali.

Para inaugurar essa nova fase do blog, em seu revival, vem aqui um trecho lido na aula passada, em que fica estabelecida a distinção entre crise e catástrofe. O conceito "centífico" de crise exclui e demarca e evita recuos infinitos. Esse recorte faz parte da prática acadêmica. A crise assim entendida é fenômeno recente, mas já dura uns 220 anos. E arrasa quarteirões e continentes e bolsas.

A novidade neste post: o perigo da combinação de crise e calamidade.
Para quem não leu o texto (e ainda não teve a bela iniciativa de comprar um exemplar do livro), uma amostra grátis a seguir:

"4. O conceito de crise, enquanto conceito sociologicamente utilizável, foi inaugurado por Marx, na crítica da economia política. Esse fato da história da ciência coincide, inclusive, com a ocorrência dos primeiros eventos de crise econômica, que, por sua dinâmica e abrangência, sobrepujaram as grandes catástrofes naturais em sua capacidade de desintegração social. O fio condutor de nossa exposição das teorias das crises será o conceito sociológico, portanto, científico, de crise; do ponto de vista da dialética materialista, enquanto crise na sociedade, toda crise é desencadeada na economia - e mesmo quando a crise é negada ou tida como fenômeno perpetuado sob  controle do Estado, supõe-se que este domine os mecanismos de superar a crise ou seus efeitos. Todavia, ao longo de nossa exposição, apresentaremos outros elementos componentes do conceito, desde sua etimologia, através da história de suas acepções, até, inclusive, sua auto-reflexão. Ora, parte da crítica das teorias das crises, bem como do seu reverso, que é a fé no progresso, depende da recuperação daqueles elementos pré-científicos abandonados durante o desenvolvimento do conceito científico de crise. Uma dialética do progresso, como a esboçada por Adorno, e, portanto, caudatária da Dialética do Esclarecimento, mantém em sua tensão interna todas as conotações não-operacionalizáveis dos conceitos crise e progresso, tais como o sofrimento, a ameaça, o processo de decisão, a decadência, a provação, a expiação, o castigo, a compensação, o crescimento descontrolado da criatura. As categorias dos discursos teológico, dramatúrgico e médico aderem aos fenômenos de crise e à fé no progresso, não só para darem conta de um resto mítico, que permanece no “mundo enquanto contexto de crise”, mas também porque  conceitos historicamente carregados, como estes dois, não podem progredir até o ponto em que, na sua busca de cientificidade, percam a própria referência às categorias crise e progresso, que eles nomeiam. (...)" BORGES, Bento I. Crítica e teorias da crise. Porto Alegre, EDIPUCRS, 2004, p. 25-26)
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A crise já se arrasta na Grécia. E, se depender de Alemanha e França, vão arrastar os gregos e as gregas pelos cabelos para fora da Europa: fiquem aí no Oriente, com turcos e curdos! Eis o que gostaria de dizer em público esse truculento Sarkozy, secundado pela macambúzia Merkel. Hoje lemos no jornal que os credores privados da Grécia vão levar um calote de 200 bilhões. Por coincidência, nesse dia 11 de março, os japoneses e o restante dos terráqueos vão se lembrar do tsunami seguido de acidente nuclear, há um ano. O prejuízo do Japão teria sido de 400 bilhões. Sem falar em mortos e feridos e contaminados por radiação, podemos ver que a catástrofe natural deu de dois a um na crise econômica. Tsunami custou o dobro. A diferença sempre lembrada pela mídia é que os inteligentes japoneses já reconstruíram quase tudo. Inclusive aquela escada rolante voltou a rolar, ao passo que a diretora do FMI vem com seu cabelo descolorido e sua pasta de medidas amargas e impopulares para os gregos.

Retórica à parte, pois aqui forcei a barra em torno de duas quantias de dinheiro. E não procede, pois são dois países e parece que as duas situações não tem conexão. Será que não? O Japão e a Alemanha, duas grandes potências em desespero permanente, sairam da guerra e apelaram para a tecnologia nuclear, pois tinham pressa em produzir e precisavam de energia. Agora, depois da tsunami que destruiu a usina nuclear, ambos países prometem reduzir esse tipo de produção de energia. Duvidem, pois não vão querer baixar seus PIBs. E aquela escada rolante, exemplo de conforto e normalidade no Japão, também consome energia... nuclear, como todos os carrinhos elétricos de ambos os países - que não são alternativa "sustentável" coisa nenhuma! Tratem de pedalar.

É claro, portanto, voltando a meu livro, que o pior dos mundos é quando uma calamidade natural leva a uma crise financeira - ou associa-se a ela, agrava-se, etc -, com desdobramentos diversos para outros sub-sistemas. No Haiti, vimos que, infelizmente, desgraça pouca é bobagem: o terremoto foi seguido de doenças terríveis e a miséria de sempre. E, nesse caso lamentável, as coisas já vinham ruins antes por motivos políticos: uma ditadura que passava de Papa Doc para Baby Doc, ou seja, a dinastia dos bichos-papões, os tonton macoutes. E antes ainda: a exploração nos tempos coloniais, que não acabaram por completo. Falam francês lá, não se esqueçam. Economia, natureza e política em degeneração combinada. Mas, igualmente juntas vêm a vontade de trabalhar e de democratizar aquela ilha, etc. (E o Brasil pode e deve ajudar os haitianos aqui e lá, os refugiados, clandestinos que buscam trabalho - não basta enviar tropas, etc.)

Os japoneses não poderão segurar ondas gigantes, pois se fizerem uma parede de dez metros, as ondas poderão vir com onze metros e... (Cá pra nóis: as baleias são vingativas e organizaram esses terremotos e maremotos... Os japoneses deviam parar com a matança de nosssas irmãs mamíferas e vegetarianas, além de desligar essas usinas perigosas, que não são exatamente uma prova de inteligência).