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quarta-feira, 23 de maio de 2012

Entre o partidão e a imprensa nanica

Partidos, esquerda & direita, imprensa nanica

Seta em um muro do Bairro São Jorge, Uberlândia, duplicada e invertida. By myself.




Como chegamos, nesta disciplina de Mestrado, aos temas “partido político” e a velha celeuma “esquerda/direita”?

O segundo capítulo do livro lido pela turma e apresentado em sala de aula, Crítica e teorias da crise (Edipucrs, 2004), tratou dos eventos de crise econômica da segunda metade do século XIX e das descrições e tentativas de interpretação das “crises” pelos teóricos & militantes Marx & Engels.

Para que os alunos e alunas se familiarizassem mais com o texto desses autores, foi sugerida a leitura de uma obra assinada pela dupla, o Manifesto do Partido Comunista (1848).

No estudo dirigido que se seguiu, coube uma pergunta sobre a coligação partidária e os critérios que os comunistas deveriam adotar, à época da publicação da obra, que parecia favorável à ação revolucionária - sem excluir a via eleitoral, portanto. Assim como os autores classificaram as diversas concepções “literárias” de socialismo, puderam dizer aos militantes a quem se dirigia o manifesto: este partido sim, aquele não, este nos convém, aquele não ajuda...

Dada a atualidade do tema coligação, por causa do atual governo Lula/Dilma, que não governa só com o PT, e também porque alguns alunos e alunas se mostraram um pouco desinformados quanto ao assunto, fizemos um painel informal e improvisado sobre partidos políticos.

Improvisado, porque partimos de nossa própria experiência de eleitores e militantes, desde o golpe militar em 1964, que implantou o bi-patidarismo (Arena e MDB) e reduziu o espaço da política e do voto. Arena era o partido dos militares e seus apoiadores: a situação. MDB reunia os democratas, com estreita margem de atuação e sob constante censura. A sigla Arena e seus caciques e votantes foram mudando, depois, para siglas como PDS > PFL> DEM. O outro lado, com a reabertura política e o fim o regime militar, tornou-se PMDB e de lá sairiam depois o PP e o PSDB. No calor das greves de 1978 e da luta pela redemocratização do país, surgiu o Partido dos Trabalhadores, que reuniu tendências diversas, inclusive grupos mais revolucionários, como os trotskistas, que tiveram que aceitar o perfil de partido de massa (e não de vanguarda). Mas o trabalhismo já existia, bem como partidos de esquerda, de longa data. O PTB, com origem em Getúlio Vargas, deu origem ao PDT – muito ligado a Brizola. O PCB, fundado em 1922, daria origem às siglas PCdoB e PPS. E é bom lembrar que o PSB e o PSTU também levam um S de socialismo. O PV, mais recente, tem também uma direção ideológica nova. Depois que Lula foi eleito, por desavenças sobretudo em torno da reforma da previdência, uns 4 ou 5 parlamentares deixaram o PT, para criar o PSOL, com S de socialismo e L de liberdade, e que reunia, já na fundação onze tendências diferentes. E, é claro, que há mais duas dezenas d partidos com siglas que não indicam muito claramente uma diferença de ideologia ou de programa – e há diversos com C de cristão e R de republicano. Na verdade, muitas siglas pequenas nesse quadrante servirão para manobras eleitoreiras – currais eleitorais e cessão de horário na TV. Sem ofensa e com a ressalva de que pode haver partido pequeno & honesto (e que o PT foi pequeno), mas na maioria são "siglas de aluguel" ou até mesmo negam a política, na qual se metem - como foi o caso do Prona de Enéasss... e do PRN, de Collor.

Informal, porque o painel não buscava, como se poderia esperar, uma rubrica acadêmica específica. Os partidos são hoje – sem desconsiderar o lastro histórico – um tema sobretudo da sociologia e do direito, por conta da análise do perfil do eleitorado (muito marcado pelas pesquisas de intenção de voto) e das questões legais relativas a prazos, filiação, coligação, distritos, fidelidade, etc.

Não pretendíamos buscar uma “visão filosófica” do partido – se é que existe – pois não se trata tanto de garimpar declarações de Hume ou Rousseau ou de recuar mais ainda. Todavia, a tematização da democracia, com base na livre discussão e em algum tipo de representatividade, sempre envolveu partidos (ou castas, facções, estamentos, classes) e algum tipo de deliberação com pretensões de legitimidade – ao contrário da facilidade imposta por ditadores, déspotas e redatores de atos institucionais que implantem estados de exceção (Brasil, 1968: vai pela Av. Rondon Pacheco, vira à direita, etc. "Chegando no destino"...)

 
Por falar em “vira á direita”, recorde-se: entramos um pouco no assunto direita & esquerda, pois os partidos de situação e oposição podem ser também assim classificados. E cabem eventualmente os rótulos de progressista/conservador (no auge: .../reacionário), reformista/revolucionário, majoritário/minoritário, etc. Tese apresentada pelo professor: pode apostar que geralmente é de direita a prosa de que não existe mais sentido na distinção direita/esquerda. E há frases de efeito como “o poder endireita a esquerda”, devido ao pragmatismo imposto pelo exercício do mandato, qualquer que seja, etc. Ou seja, ainda faz sentido ver as diferenças, sobretudo se é você pende para a esquerda. Nivelar é uma tática dos extremistas, em ambas direções. Sempre alerta contra aquele bordão de que Lula se igualou a FHC. Não procedia - e não prosperou o tucanato.

Exemplo: em 2004, antes das eleições para a prefeitura de Uberlândia, os 6 candidatos foram semanalmente sabatinados pelo jornal local, o Correio. Sobre o tema “Segurança pública”, os candidatos se dividiram meio a meio: 3 falaram sobretudo que iam instalar equipamentos de vigilância, contratar mais policiais, comprar mais armas e camburões. Os outros 3 tocaram também na necessidade de identificar causas sociais da criminalidade e de promover políticas de inclusão social e a cultura da paz e da vizinhança. O primeiro grupo tem perfil conservador; o segundo ainda assume valores de esquerda.

Exemplo desta semana (22/5/ 2012), também em matéria publicada no Correio. Tema: acessibilidade geral, passeios públicos intransitáveis e obstruídos. Caso de ambulância: uma mulher tropeça em defeito no piso de uma calçada, cai e quebra o fêmur. Comentário do Secretário de Planejamento urbano, Rubens Kazuchi Yoshimoto: “Não é possível pedir para que parte da cidade destrua suas calçadas e as refaçam. O cidadão já tem o direito adquirido se construiu daquela forma antes de 2010”.



Que estranho! Essa categoria amorfa de cidadão fica ainda mais deturpada nesta administração conservadora, pois... (eis a análise do discurso e da prática da oligarquia ruralista) o cidadão é o proprietário. A senhora que caiu e ficou na cadeira de rodas – e podia ser um jovem, um atleta – não é cidadã? E, por acaso, o dono da casa tem o “direito adquirido” de derrubar pessoas? Tanto faz, pois o ponto de vista do poder é o da propriedade particular...



E por falar em jornal de papel, fizemos também uma pequena exposição de publicações da imprensa atual que não se alinham e nem se submetem por completo à lógica do capital, como ocorre com a grande imprensa, hoje também chamada de PIG... Veja bem, além dos três grandes jornais, Folha de SP, Estado de SP e Globo (RJ) – que também dominam nas comunicações de TV, rádio e net; com a Band a distribuir um jornal de papel grátis nas esquinas – o que podemos ler? Resposta rápida, com títulos que podemos comprar na banca do campus:



Brasil de fato – jornal semanal ilustrado, 16 páginas, 3 reais, em seu décimo ano, inicialmente ligado ao movimento do Forum Social. Exemplo de matérias, na edição 472 (15 a 21 de março de 2012): Código florestal, nas mãos de Dilma; Gaza: sobram mísseis e faltam água e luz; Modelo de repressão urbana chega a Curitiba; entrevista com Iná Camargo: “Intelectuais têm pavor de revolução”.


Caros amigos – no 15 ano, publicação mensal, 46 páginas, $10,90 – matérias na capa do nº 181: Desigualdade urbana: políticas públicas geram desigualdade na maior cidade do país; Impactos da copa – FIFA fatura alto, quem paga é o povo; Torturador pode elucidar Operação Condor; Mulheres presas pedem direito de amamentação; Entrevistas – Edi Rock, “A gente faz é música negra” e Mike Davis: “Em defesa do espaço público”. A publicação, meio jornal e meio revista, traz ultimamente o subtítulo “a primeira à esquerda” e isso lhe cai muito bem.

A Nova Democracia, ano 10, mensal, 20 páginas, 2 reais, com o aviso junto ao título “Este jornal nao é órgão de nenhum partido” e uma convocação: “apóie a imprensa popular e democrática”. Exemplo de matérias, na capa da edição nº 87, março de 2012: “Burgueses e reacionários, tremei!” [com uma lista de greves e manifestações, na India, na Europa, no Brasil], Da Guerrilha do Araguaia á capitulação de Amazonas (cap. VIII da história do PCB), Incra é “desmobilizador da luta pela terra”, USP: reitoria reedita regime militar, Imperialismo tenciona repetir a Líbia na Síria, etc.

REVOLUÇÃO QUE SE ALASTRA


Acrescento um jornal alemão, que nos chega em permuta na revista Educação e Filosofia. O nome Grasswurzel Revolution talvez seja traduzido hoje como “revolução rizomática”, mas a idéia é “revolução que se espalha e se firma que nem raiz de grama”... Está no ano 40, é mensal e custa 3 euros. Temas na capa do nº 367, de março de 2012: O Irã e o perigo de uma nova guerra, Um ano de Fukushima – para onde vai a escalada da energia atômica?, Novidade no comércio: a eutanásia, Estado ou revolução, Slavoj Zizek, um cara da esquerda... e a revolução. [O jornal anarquista promove manifestações e campanhas contra o racismo e anati-sexistas - aqui uma mulher critica as pretensões de esquerda de um Zizek que cometeu um deslize machista... É o maluco na chapa quente! ]

Campanha bacana essa, com adesivo na bike:
"ENERGIA ATÔMICA? NÃO, OBRIGADO!"


Por fim, ainda vamos levar a sala de aula duas revistas acadêmicas, mais pesadas, que cobrem esse campo, puxando para o enquadramento teórico mais estrito e alinhado: as revistas Crítica Marxista e Margem Esquerda.

Margem Esquerda, nº 17:
Capitalismo no beco escuro


Margem Esquerda, nº 17, o mais recente, trata disso: O capitalismo atingiu um beco sem saída? A perspectiva de uma crise econômica crônica, o colapso do Estado de bem-estar social nas economias avançadas e a catástrofe ecológica abalaram as bases dos argumentos em favor do capitalismo. Nesse contexto e tendo em vista os desafios do século 21, repensar o socialismo é um projeto viável? (...) ver no site da editora Boitempo.

A embalagem da tal "água negra"
continua chamando para a reflexão sobre
o imperialismo - e notem que há um artigo de
crítica a Habermas... meio atrasada, digamos.


Crítica Marxista, revista semestral publicada pelo Cemarx (Centro de Estudos Marxistas), da Unicamp, está no nº 31.


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Este blog presta aqui uma homenagem a dois partidos de esquerda:
o PSOL, na figura de Ivan Valente, fez no parlamento a crítica mais radical
à exploração capitalista dos recursos naturais, que se reflete na versão Piau
do Código Florestal, hoje nas mãos da Presidenta Dilma, que pode vetá-lo;
e o PSTU, que em seu programa da semana passada,
na TV, alertou sobre direitos de trabalhadores em barragens, no Norte, e de sem-teto,
no Sul, e também reservou os últimos 3 segundos para a bandeira "VETA TUDO DILMA".